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Chegada a Santorini

Os gregos inventaram a democracia e os romanos um sistema burocrático de império governável à distância. Os medievos revolucionaram o aproveitamento da energia hidráulica, criaram o género no vestuário e o relógio. Os modernos fundearam a civilidade e a privatização. Os contemporâneos deram ao mundo a máquina a vapor, a lâmpada, a medicina moderna e o computador. O pós-modernismo (ou lá o tempo em que vivemos) democratizou a internet e o acesso aos céus. O tempo é elástico, mas este progresso que nos parece constante talvez não o seja. Tenho a certeza que se um grego antigo conseguisse ver Santorini dos céus ter-se-ia louvado por Zeus; talvez tivesse aproveitado a vantagem para fazer uma ditadura ou ganhar uma guerra; ou, por agradecimento, houvesse mandado erguer um templo. O acesso ao novo, a procura incansável pela validação e distinção em relação ao outro garantiram o nosso progresso; não necessariamente positivo; não necessariamente constante; as novas tecnologias tornam tudo mais nítido e rápido. A sociedade do instantâneo e do volátil; o eu da sedução num outro do desejo. Serão os pássaros de metal cultura material de tudo isto? Certo é que o azul deste mar parece bem mais longo e perfeito do que as pernas de um qualquer colosso rodiano às portas da Nova Iorque.

Luís Gonçalves Ferreira, 24 de maio de 2018

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Que gelado seriam?

Se fossem um gelado da Olá qual seriam? Porquê? Eu seria um Swirl de Chocolate: intenso, múltiplo, Yin e Yang das sensações. Eu sou assim: entre a diversidade e a unidade, entre a simplicidade e a complexidade. Divirtam-se! Sem mais, Luís Gonçalves Ferreira PS.: Como repararam, podem optar por outros gelados que não os do catálogo mostrado. Tem é que ser Olá e não valem os "porque sim" como resposta.

Por detrás da nova imagem deste canto

 We must crown our heroes A lógica iluminista, inteligente, simbólica e imperial do Terreiro do Paço sempre me encantou. Significa a profundidade que as peças de arte (de qualquer género) devem conter: um pedaço de História. Estar ali, no meio, virado para o Tejo é um transporte no tempo. Espelha um malogrado destino de um país que, outrora potência, reconstruiu, por infortúnio do tempo, um pedaço medieval, transformou-o em algo novo e apresentou-o ao Mundo. É como se, ali, num pedaço de chão, estivesse a réstia triste de um Império e o movimento hostil de um país que cresceu, ano após ano, século após século, de uma forma atabalhoada, confusa, mas sempre com uma imagem exterior límpida, renovada. Foi isso que guiou Dom João V, Dom José e o seu Marquês, a I República e a sua incursão na Guerra, Salazar e a sua exposição em 1940, a Expo 98', o Europeu de Futebol e que guia o TGV. São imagens que nos guiam como povo. Não interessa se se morre de fome para além de Lisboa. Não importa

Suor de que rosto?

Barrete de penas. Luvas até ao cotovelo. Sabor a ananás. Cachecol cor de pêssego. Lábios singelos de doçura profunda.  É triste estar-se triste. Peço desculpa por só vos trazer isto nestes últimos dias. Posso começar todos os parágrafos das minhas falas com coisas desconexas para parecer que estou louco. Estar louco traria justificação para o meu estado de espírito, mas seria uma farsa. Um travesti de sentimentos. Um ensaio. Um teatro. O final é o mesmo. O de sempre. Não consigo mentir por mais do que algumas frases. Falar novamente em ananás, luvas e lábios seria cenário artificial de um livro qualquer. Silêncio. Prefiro o silêncio a mim mesmo. Sou eu mesmo na companhia de mim mesmo. Provavelmente, estou farto de mim. É isso. Fecho as asas. Os olhos. E o coração. Seria muito mais fácil ser uma pedra, quieta, calada, e parar de escrever para sempre. Parar de escrever seria deixar de ser. E de sentir isto.  Não, Luís. Cala-te! Não escrevas mais! Desconfortas os outros com o que dizes. A