As cortinas desceram e faltavam dez minutos para as onze. Era, por certo, um pouco tarde para esconder o sol que lhe aquecia as feições, mas Maria sabia que não havia descansado por outra razão. Depois de ter perdido demasiadas coisas na vida, e ter ganho consciência dos ganhos maiores que tivera sofrido, o vazio emocional era enorme na proporção da sua insatisfação. Queixara-se, faz tempo, a um amigo, que o deambular diário que fazia não lhe preenchia as medidas. Aos conselhos fez orelhas aparentemente moucas, e continuara a sair à rua desesperada por algo novo que lhe modificasse o eixo de vida, como se a mudança não partisse de dentro para fora, mas ao contrário. Talvez seja esse o maior problema da existência humana: os erros de auto-análise. Maria, por acaso chamada assim, era disso exemplo, como todos os outros parvos e parvas que sofrem por aquilo que não têm e talvez nem sequer tenham tido. "Parvos" dos medievais, históricos, e dos modernos, esse já "idiotas...