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A mostrar mensagens de outubro, 2017

pombeiro

Ignorantes, decidimos em cima do joelho que queríamos fazer a Rota do Românico. Entre os vales, optámos pelo do Sousa. Combinámos e seguimos em direção ao primeiro destino: Pombeiro, muito perto de Felgueiras. Um monumento encravado num vale, perdido no tempo, como os beneditinos tanto gostavam: muito fresco, cheio de verde, apesar dos demónios que a terra tem visto. Começamos logo a rezar: o claustro, a igreja e as pedras - tudo que rima com ruínas, à boa maneira desta querela universal entre a razão e deus, cujas invasões dos franceses e o liberalismo rasgaram na nossa memória coletiva. Certamente, foi por isso que os regrantes tanto rezaram: pecados que foram os seus ricos anéis e pesadas mitras; hoje, na imensidão, o Pombeiro está entregue a um curioso segurança que toca Yann Tiersen num órgão ibérico. Ainda agora, perdido na desilusão de tantas igrejas fechadas, é nele que esbarram as minhas emoções. Não avisou nada para além de que sabia pouco de passado, que era um curioso: a h

Cântico Negro de José Régio

"Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces Estendendo-me os braços, e seguros De que seria bom que eu os ouvisse Quando me dizem: "vem por aqui!" Eu olho-os com olhos lassos, (Há, nos olhos meus, ironias e cansaços) E cruzo os braços, E nunca vou por ali... A minha glória é esta: Criar desumanidades! Não acompanhar ninguém. — Que eu vivo com o mesmo sem-vontade Com que rasguei o ventre à minha mãe Não, não vou por aí! Só vou por onde Me levam meus próprios passos... Se ao que busco saber nenhum de vós responde Por que me repetis: "vem por aqui!"? Prefiro escorregar nos becos lamacentos, Redemoinhar aos ventos, Como farrapos, arrastar os pés sangrentos, A ir por aí... Se vim ao mundo, foi Só para desflorar florestas virgens, E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada! O mais que faço não vale nada. Como, pois, sereis vós Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem Para eu derrubar os meus obstáculos?... Corre, nas

catedrais

Há duas ou três coisas de que gosto muito: as pessoas castiças são uma delas. Daquelas que têm carácter e dizem as coisas sem rodeios; das que continuam a amar, mesmo depois de mil demónios lhes terem arrancado o coração; das que abraçam e beijam e amam pessoas do mesmo sexo na rua, sem medo dos ovos podres que são os olhares dos outros. Eu gosto muito de pessoas que se dão e se entregam e se amam. E quando me esqueço de como é bom ser e sentir, abrindo uma espécie de saleiro emocional na minha cabeça, aparece um sorriso maroto que me faz tropeçar.  Gosto de gargalhadas e de dentes felizes. Gosto muito daquele jeito meio atrapalhado de alternativo-pop. Gosto muito de gente que me faz sentir calor dentro das veias. Gosto ainda mais quando, entre copos de vinho, os gestos falam mais do que mil bocas em conjunto.  Lamentos aos mapas, aos tempos e aos sonhos, e estaria certo que, na rua, em casa, no corpo e na mente, os sinos da catedral iriam tocar a repique por cada beijo nosso.