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Uma coisa sem sentido

Apetecia-me fugir, velozmente, contigo no peito. Morávamos num quartinho qualquer, mas estarias sempre comigo. Faríamos uma promessa boba de amor-eterno, e eu juraria enclausurar-te na minha abadia sentimental. Ora tocariam os sinos, ora trincava-se o trigo e joio. Ceifávamos os episódios maus com coragem de leão. Frequentaríamos os sonhos mútuos, e os projectos singulares de cada um. Tu morrerias para os teus, e eu para os meus. Seriamos só os dois. Com um violino de orquestra, estaríamos em uníssono neste chinfrim terrestre. Guarde-te-ia sempre no peito. Fá-lo-ia se o tempo não trouxesse as surpresas e os desesperos matinais. Eu não gosto de acordar cedo. Os sonhos são pesados e os pesadelos leves. Estou farto deste faz-de-conta e desta estória de meninos. Vamos ser crescidos e morrer um para outro.

Rompimento. Rompemos com o mundo, como o nosso Mundo. Nos filmes os vilões e os finais tristes vendem muito mais. Facturemos 100 milhões de €uros numa bilheteira qualquer. Ricos, felizes, mas um sem o outro. Volta-e-meia, voltaremos a ser amantes, mas só para outro filme de Inverno. Não te quero. Nunca te quis. Aliás, é a carteira que chama por ti. O coração, esse vagabundo, está lacrado com tinta chinesa empastada em acrílico de cetim.

Devaneios. Simples alucinações. São os cogumelos!

Sem mais,
Luís Gonçalves Ferreira

Comentários

  1. Eh la, Luis. Grande pérola literária. Esmeraste-te.

    Gostei muito.

    Abraço

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  2. "Ceifávamos os episódios maus com coragem de leão."
    Que texto :O

    Quanto aos cogumelos, se te fazem escrever assim não os largues XD

    ResponderEliminar

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