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Fatalidade de se ser

Essa coisa de se afirmar, peremptoriamente, que X é superior a Y tem que se lhe diga. Se a questão da superioridade não for bem colocada e analisada, incorrem-se riscos parecidos com o arrojo do anti-semitismo doutros tempos, onde a realidade se ser eminentemente superior advém de uma consciencialização cega, oportuna, paulatina, que, de forma mediata, vai-se apoderando da percepção dos endrominados. Não queiramos cair na problemática dos julgamentos de Nuremberga, onde o facto de algo ser normativamente legítimo levou as pessoas a cometerem actos que vão contra a sua própria natureza. A confiança cega, surda e muda nalguma coisa estreita-nos os campos de visão, veda-nos a razão e amordaça os nossos sentidos a convenções e estereótipos alheios a nós mesmos. A certa altura, tomámos como nosso um pensamento alheio, que nos foi fixado, mesmo sem que o tenhamos querido. Nesta componente sociológica, que justifica a aparente injusticabilidade de alguns comportamentos humanos, a razão da análise empírica empobrece-se e até pode ser menosprezada.

Mas, não deveria o ser humano, como livre e independente, perceber que o seu comportamento é censurável na medida em que vai contra a sua génese? Em que posição ficam as suas crenças e valores quando uma instituição lhe formata, sem pedir licença, e de uma forma despótica, o seu próprio pensamento? E a experimentação? Devemos deixá-la perdida nas nossas bibliotecas monótonas, cheias do mesmo? Teorias monocéfalas são como comunistas cheios de Marx e Engels e capitalistas repletos de Locke e Smith, onde os espaços são vazios de contraditório e ocos de respeito pelos mais ténues vínculos entre teorias mentalmente concepcionadas como antagónicas e rivais.

Luís Gonçalves Ferreira

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Pensar mais do que sentir

Tenho saudades de ser pequeno, livre e inocente. Sinto falta da irresponsabilidade de ser cândido e não saber nada sobre nada. Estou nostálgico em relação ao Luís que já existiu, foi, mas que não voltará a ver-se como se viu. Este corpo e alma que agora me compõem são reflexos profundos da minha história. O jeito de sorrir, abraçar e beijar reflectem os sorrisos, abraços e beijos que fui recebendo. Sinto falta do Luís que só sabia dizer mamã e Deus da má'jude . Sinto a ausência das pessoas que partiram e que naquele tempo estavam presentes. Sinto saudade de só gostar da mãe e de mais ninguém. Sinto saudades de sentir mais do que pensar. É um anseio que bate, mas nada resolve, porque apenas cansa a alma. A ausência corrói a alma e o espírito. É nestas alturas que penso que a Saudade e o fado são as maiores dores de alma que consigo ter. Provavelmente, sou mesmo um epicurista. Luís Gonçalves Ferreira

Sem parágrafos

Por momentos  - loucos, é certo - esqueço-me de mim e sou capaz de amar. Amar sem parar, com direito às anulações, sofrimentos e despersonalizações que os amores parecem ter. Por momentos - curtos e fugazes - eu esqueço-me de mim e sou, inteiramente, completamente, antagonicamente teu. Entrego-me, como quem não espera um amor livre. Dou-me como quem sente que as minhas vísceras são as tuas entranhas. Abraço-te como quem encosta os corações, que outrora estavam frios, gelados e nus. Aproveita, meu amor, eu sou teu. Aproveita que estou louco e leva-me contigo, para sempre. Rapta-me o corpo, a mente e o descanso eterno deste insano coração. Corres, contudo, o sério risco de não me levares por inteiro. Prefiro trair o coração que a mente, amar a imagem do que viver intensamente a vida de outrem. Amor, querido e visceral amor, leva-me e mostra-me que existes. Não sei quantas horas tenho para cumprir esta promessa que fiz a mim mesmo. A memória irá voltar e corres risco de já não me acha...