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Suor de que rosto?

Barrete de penas. Luvas até ao cotovelo. Sabor a ananás. Cachecol cor de pêssego. Lábios singelos de doçura profunda. 
É triste estar-se triste. Peço desculpa por só vos trazer isto nestes últimos dias. Posso começar todos os parágrafos das minhas falas com coisas desconexas para parecer que estou louco. Estar louco traria justificação para o meu estado de espírito, mas seria uma farsa. Um travesti de sentimentos. Um ensaio. Um teatro. O final é o mesmo. O de sempre. Não consigo mentir por mais do que algumas frases. Falar novamente em ananás, luvas e lábios seria cenário artificial de um livro qualquer. Silêncio. Prefiro o silêncio a mim mesmo. Sou eu mesmo na companhia de mim mesmo. Provavelmente, estou farto de mim. É isso.
Fecho as asas. Os olhos. E o coração. Seria muito mais fácil ser uma pedra, quieta, calada, e parar de escrever para sempre. Parar de escrever seria deixar de ser. E de sentir isto. 
Não, Luís. Cala-te! Não escrevas mais! Desconfortas os outros com o que dizes. As plantas continuariam vivas se, hoje, às imensas horas, deixasses de existir, simplesmente. És estéril, nobre pessoa. Vago e vazio. Interessas enquanto tens vida e estás alegre. Deixaste-te ir. Afinal és frágil e estás num beco sem saída.
Cala-te, Luís. Estás-te a renegar? És um perfeito idiota. Vales muito só porque és o que és. E sim, haveria gente a sentir a tua falta. E sim, gostariam de ti, mesmo sem o corpo presente. E lembrar-se-iam que exististe. E cumpriste o teu papel de lhes marcar a vida com o que lhes tinhas para dizer.
É difícil sentir que se tem uma missão. Missão essa que poderá sacrificar projectos e ideias e o simples facto de seres feliz em alguns quadrantes da vida.
É esquizofrenia falarmos connosco próprios e mudarmos de pessoa parágrafo-a-parágrafo. Eu sinto-me a ficar louco. Insano. E este texto enferma de loucura. De raiva. De suor. Foi sempre isto que eu quis deste blog: que fosse o suor do meu rosto. Eu sou mesmo confuso. Estou uma bagunça. E a dislexia organizacional deste texto é reflexo disso. 

Obrigado por continuarem aí.
Luís Gonçalves Ferreira

Comentários

  1. adoro o poema ao lado, adoro fernando pessoa(:

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  2. Parar de escrever, é desistir, e desistir é coisa de fraco.
    Eleva a tua douta alma plena de engenho e continua a partilhar a tua escrita.
    Gostei bastante dessa auto-avaliação psicológica...

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  3. Não me deixa triste ler o que disses-te. Deixa-me com vontade de te dizer "(re)ergue-te luis". Tu és das pessoas que tem as palavras mais bonitas entre os dedos, transforma-as em sorrisos, em palavras claras e de vontade.
    Faz isso por ti. Não por nos, pois nós continuamos aqui a espera do Luis, de qual não importa, mas do Luis!
    Da pessoa que aqui vemos reflectida e agora baralhada e do avesso. Procura o teu lado "direito". Ve-te nas coisas belas que tens :) no teu coração por exemplo!
    Ele guia-te eu tenho a certeza, basta deixares!

    Beijinho da Francisca, vá oupa a pé :)

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  4. Acho que isto basta: não vou sair daqui nunca Luis!
    Já procurei ser como tu, ter a tua garra interior, o teu animo natural, a tua força. Peço-te agora que tentes encontrar em mim um bocadinho da coragem que precisasneste momento para seres alma e coração ao mesmo tempo como sempre foste (e serás) :)

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  5. sobreviver à palavra é preciso!

    asim é que está correcto.

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  6. sobreviver à paavra é preciso!!


    um forte abraço

    ResponderEliminar
  7. Apenas não são frágeis os que não têm sentimentos. Continua a lutar até encontrares saída nesse teu suposto beco. Porque na vida não os há. As saídas, pelo menos as correctas, é que costumam oferecer resistência, valendo sempre a pena.
    Força, e um grande grande beijinho. *

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Pensar mais do que sentir

Tenho saudades de ser pequeno, livre e inocente. Sinto falta da irresponsabilidade de ser cândido e não saber nada sobre nada. Estou nostálgico em relação ao Luís que já existiu, foi, mas que não voltará a ver-se como se viu. Este corpo e alma que agora me compõem são reflexos profundos da minha história. O jeito de sorrir, abraçar e beijar reflectem os sorrisos, abraços e beijos que fui recebendo. Sinto falta do Luís que só sabia dizer mamã e Deus da má'jude . Sinto a ausência das pessoas que partiram e que naquele tempo estavam presentes. Sinto saudade de só gostar da mãe e de mais ninguém. Sinto saudades de sentir mais do que pensar. É um anseio que bate, mas nada resolve, porque apenas cansa a alma. A ausência corrói a alma e o espírito. É nestas alturas que penso que a Saudade e o fado são as maiores dores de alma que consigo ter. Provavelmente, sou mesmo um epicurista. Luís Gonçalves Ferreira

Sem parágrafos

Por momentos  - loucos, é certo - esqueço-me de mim e sou capaz de amar. Amar sem parar, com direito às anulações, sofrimentos e despersonalizações que os amores parecem ter. Por momentos - curtos e fugazes - eu esqueço-me de mim e sou, inteiramente, completamente, antagonicamente teu. Entrego-me, como quem não espera um amor livre. Dou-me como quem sente que as minhas vísceras são as tuas entranhas. Abraço-te como quem encosta os corações, que outrora estavam frios, gelados e nus. Aproveita, meu amor, eu sou teu. Aproveita que estou louco e leva-me contigo, para sempre. Rapta-me o corpo, a mente e o descanso eterno deste insano coração. Corres, contudo, o sério risco de não me levares por inteiro. Prefiro trair o coração que a mente, amar a imagem do que viver intensamente a vida de outrem. Amor, querido e visceral amor, leva-me e mostra-me que existes. Não sei quantas horas tenho para cumprir esta promessa que fiz a mim mesmo. A memória irá voltar e corres risco de já não me acha...