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O Sepulcro de Deus

Viveste uma missão e foste erguido ao alto, para mais perto de Deus. No leito da tua própria sina, interrogaste quem prometeste jamais questionar. E logo depois aceitaste o teu futuro e renegaste o que te tentava, enquanto todos dormiam. Penitenciaste os teus traços, suaste sangue e, com os teus dedos, ordenaste a Terra na própria terra, como havias feito, no passado, ao lado do pecado que perdoaste. Ceaste com os teus e cumpriram-se os teus próprios desígnios. Prenderam-te, cuspiram-te, negaram-te, traíram-te. Carregaste um jugo que não era teu, uma mágoa que não era só tua... um pecado que não te manchara, nem uma vez. Aconselhaste: não perdoes sete, mas setenta vezes sete. Ninguém te perdoou, porque nada havia a perdoar, mas limparam-te o rosto, deram-te de beber, carpiram por ti. Do alto do mal que tentara possuir as veias, foste soberano no bem que sempre proclamaste. Morreste entre o bem que prometeste salva e o mal que a trovoada, o demónio e o corvo consumiram numa bicada. Hoje, milénios depois de ti, da tua morte,  Jesus Nazarenus Rex Iudaeorum, é relembrado nos roxos ternos dos senhores da Igreja como dentro das pessoas. As civilizações tocam os sinos por ti, do alto das Igrejas aos valores dos seus gestos, mesmo de ouvidos tapados ou de gestos fundidos para não se notar a tua influência. E tu estás em todos. No bem que significam e no mal que lhes tenta. Na diferença entre o humano e o divino que cada ser tem. És o Alfa e o Ómega, O princípio e o fim. Perto da última caminhada, apeteceu-me lembrar-me de ti. Toquem os sinos a defunto, porque fomos como somos a única raça de bicho que matou e sepultou um Deus.

Luís Gonçalves Ferreira

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