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Crítica desobstruída

As questões do mundo. As infindáveis perguntas sobre os sentidos, os rumos, as circunstâncias de morrer ou de viver. Uma procura incansável pelo absolutismo de estar, experimentar, seguir caminhos e contornar obstáculos. A fuga da solidão, a busca dos prazeres fáceis - somos uma sociedade do oculto: de nós mesmos. Das terapias alternativas, da dissolução da ciência, da quebra da medicina tradicional e das Igrejas monoteístas. Somos um rumo sem rumo. Um caminho com tantos caminhos. 
A re-fundação do ser humano passa pelas crises económicas, pelos papas que renunciam, pela busca incansável do conforto para o ser que não somos, mas queremos ser, sem nunca deixar de querer ser aquilo que é: uma espécie de um reencontro com a energia de um nascimento. É o encontro no imediato, no tangível, no âmbito do concreto. É uma abstracção da caridade, do fundamento dos outros, onde sobra a regra do egoísmo para se sofrer menos. 
Todos se procuram a si próprios, depois de tanto tempo a acharem-se donos de si. E isso é um erro: essa insatisfação do que se tem e o sofrimento pelo sonho e a expectativa do que se pode vir a ter. É a não aceitação da realidade. As medicinas, as igrejas, os deuses, as filosofias, as economias e as tradições de sempre estão a refundir-se, no cálculo do novo espaço em que nos enfiamos. É um aquário gigante em constante ausência de oxigénio: morrem peixes por asfixia e vai sobrando outro tanto gás livre para  mais alguns se prolongarem por um pouco. 

Luís Gonçalves Ferreira

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