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Cortina

Grito surdo num túnel de vento. Angústia. Pânico. Nojo. Fobia do desprezo, do desengano, do desapego. Arrependimento. Interesse. Amor. É um fogo desértico num corpo gelado de revolta, raiva. Talvez seja tão-só repulsa num corpo prostituído por um vagabundo. É um instante que nem gritar livremente me permite. Estou preso numa câmara com oxigénio milimetricamente controlada. É um crime de guerra numa operação de gosto e desengano. É como um vómito entalado no meio do choro. É uma represa prestes a abrir comportas. 
Não há preces que valham nem santos que acudam e há muito que promessas deixaram de fazer sentido. É uma prisão de cordas, tolas cortinas. O pano não cai. A dor não passa. O barco não acalma. O mar nem abranda. 
Casca de laranja que flutua pelo mar. Há um grito mudo que não sai. 
Fumaça.
Repulsa. 
Desengano.
Cortina de Raiva.

Luís Gonçalves Ferreira

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Pensar mais do que sentir

Tenho saudades de ser pequeno, livre e inocente. Sinto falta da irresponsabilidade de ser cândido e não saber nada sobre nada. Estou nostálgico em relação ao Luís que já existiu, foi, mas que não voltará a ver-se como se viu. Este corpo e alma que agora me compõem são reflexos profundos da minha história. O jeito de sorrir, abraçar e beijar reflectem os sorrisos, abraços e beijos que fui recebendo. Sinto falta do Luís que só sabia dizer mamã e Deus da má'jude . Sinto a ausência das pessoas que partiram e que naquele tempo estavam presentes. Sinto saudade de só gostar da mãe e de mais ninguém. Sinto saudades de sentir mais do que pensar. É um anseio que bate, mas nada resolve, porque apenas cansa a alma. A ausência corrói a alma e o espírito. É nestas alturas que penso que a Saudade e o fado são as maiores dores de alma que consigo ter. Provavelmente, sou mesmo um epicurista. Luís Gonçalves Ferreira

Sem parágrafos

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