Lembro-me de ter pegado, pelas costas, na pouca casa que tinha e fugido para o conforto mais próximo que conseguia criar. De dispor as coisas da forma mais arrumada que conseguia, mesmo sem fotos nem quadros para pendurar. Imaginava se irias gostar da nova vida que estava a começar a construir: Se te irias orgulhar; Se quererias fazer igual; Se poderia ser uma inspiração.
Durante meses, sonhei. Acordado e a dormir. Acho que só sonhava: Que me entrasses pela porta adentro e dissesses "mostra-me o nosso quarto". Nunca aconteceu. Foram longas as horas, os dias, os meses, e é tão breve que fará um ano. (Que lapso insano de tempo.)
Veio o primeiro, o segundo, ficaram cá amigos. Vi-me obrigado a quebrar a promessa e a dissolver tal desejo. Vi-me escravo em deixar-te ir, mesmo contra a minha vontade. Vi-te fugir e aproximar. E vi-te, mais das vezes, da fechadura da porta. Eu achava que era uma janela.
Sonhei contigo. Sonhei connosco. Com filhos, e casa, e famílias reunidas. Imaginei tudo isso. E sonhei, mais um pouco, por terras que nem tão-pouco imaginava que queria ter conhecido. Superei-me aí, nessas visões, nas materializações, nas superstições. "À terceira é de vez", defendia eu, e não foi. Como muitas coisas não tinham sido. E como não tinha acontecido, depressa recontei tudo outra vez, só para tornar possível, no sonho, outra terceira parte de uma laranja infinita. Não sei se te amei ou simplesmente me apeguei à réstia de esperança. Era a luz para sair do buraco em que me havia metido. Nunca me tinha sentido tão vivo. Nunca tinha acordado com tanta esperança. Nem que fosse a de entrar no carro e, por um acaso que tanto desejava, tocasse a nossa música. A música tocava dentro de mim. Era o única pretexto que precisava para acreditar mais um centímetro na infinitude daquele deserto. Sonhei. Muito. E disso não me arrependo. Só tenho pena de ainda estar no quarto, no tal quarto, e que da história das suas paredes também se conte através de ti.
Luís Gonçalves Ferreira
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