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Fecha os olhos e agradece: ao sol, às nuvens, à imensidão infinita à tua frente. Fecha os olhos, serra as fobias, caminha lentamente, e sente o cheiro à grama e terra molhadas. É uma dádiva enorme estar vivo. 
- E é-o saber sofrer. -
"Chegamos sempre ao sítio onde nos esperam", diz o visionário. E é verdade. De dentro do caos da mente, nas pernas apertadas do medo, da insegurança, da estética salgada das tuas imperfeições. Máscara ao alto, sem decifrar as rugas que agora vês, depressa te apercebes como cresceste. Acomodas-te às cicatrizes, e sabes que são tuas. E como agora sabes amar o que és, passas os dedos, decoras os relevos, e colocas as metáforas perfeitas para fugires às perguntas indiscretas que toda a maquilhagem escapa. Sem desmerecer, nem desmotivar, nem tão-pouco perder gosto, apaixonas-te, lentamente, pela personagem que agora és. Olhos no espelho, da casa de campo que são as tuas emoções.
"Fecho os olhos e adormeço", e há um quentinho único nas minhas costas. É um guarda, um sonho, ou tão-só um nevoeiro temperado que te aquece a alma. 
Soldado-da-paz, soldado-do-tempo, soldado-de-ti. E uma força que é o melhor do tempero para os sonos. Uma medicação natural, que em nenhum frasco tens. Fecha os olhos, relaxa o músculo, e enlaça a mão. Aceita, recebe e dá. É uma meditação e encontro transversal. "Não sei quantas almas tenho".

Luís Gonçalves Ferreira 

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