Lembro-me de, em menino, perguntar à minha mãe pela razão de Jesus estar crucificado, no centro das Igrejas, e não em Glória e ressurreição. A minha mãe dizia-me que o sofrimento é uma dádiva, uma bênção, e que nos renova, a partir dali. Jesus - o Cristo - era morto para nos recordar disso mesmo.
As palavras não eram exatamente estas, e eu não percebia nada do que a minha mãe me queria dizer. Como era possível que o sofrimento fosse, numa essência tão pesada, uma coisa boa? Não via aquelas palavras como não as entendi por um bom número de anos.
Hoje é diferente e ter "luz" (no sentido mais ou menos espiritual do termo) é muito provavelmente isto de se perceber a vida de uma perspetiva diferente, segundo os mesmos olhos.
Estive a ver um episódio de uma série que fez recordar a morte da minha avó. Revivi o peso da partida, os tempos difíceis que se seguiram, e as memórias que fui colhendo de forma mais ou menos tímida. Mudou muita coisa na minha vida, no entretanto, e ainda bem que assim foi: há esperança em cada final.
Quando os poetas falam em eternidade e Glória, do início eterno que a morte significa, estavam a falar de uma imensa posteridade que fica de nós na vida dos outros. As pessoas são eternamente vivas nos finais que nos condicionam e nas linhas que nos inquinam. Não há nada de espiritual na eternidade: afinal a memória é carnal, deus é o medo de estarmos sós, e eu chamo-me Luís.
Luís Gonçalves Ferreira
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