Eis-nos chegados ao fim de um ciclo. Hoje acontece um dia triplamente especial: a última das minhas irmãs casa-se; o papá celebra o aniversário; e, amanhã, acordará, com o primeiro de maio, o dia de todas as mães do mundo. Por isso, hoje gostava de celebrar, convosco, a nossa família. O catálogo magnífico de valores que fazem deste dia e destas palavras possíveis moldaram-se numa educação atenciosa ao outro e preocupada com uma vida sobre bons princípios seguindo a moral cristã.
Falar da mãe ou do pai nem sempre é fácil, porque rapidamente as lágrimas nos embaciam os olhos e a voz treme por dentro. O pai e a mãe são as unidades mais profundas de amor autêntico: é deles que retiramos as formas dos outros amores e é por eles que aprendemos a amar todas as outras pessoas que connosco se cruzam. Como se estas fossem as fórmulas matemáticas que rapidamente calculamos a cada encontro que nos acontece.
Permitimo-nos a ser felizes sabendo que existe um porto-de-abrigo ao qual podemos voltar em todas as ocasiões das nossas vidas. Às vezes não o dizemos, especialmente por sabermos eternos; hoje queria fazer diferente e perpetuar a gratidão que sentimos por termos sido destinados ao lar que nos acolheu, ao nascimento, como quem joga as folhas à chuva.
O amor dos pais é o mais universal de todos os amores e só comparável ao que Deus, também nosso Pai, sentirá por todos nós. É um amor absoluto, preparado para a entrega e abdicação; é a capacidade para encarar estes dias, de fim de ciclo, com orgulho, sabedoria, consciência, mas também medo e até tristeza; amar é também saber despedir-se, pois do amor autêntico se espera a liberdade.
Temos pais maravilhosos, mas também familiares e amigos incríveis: é bonito ver-nos aqui juntos. A Francisca, a mamã, o papá, o vovô, as tias e os tios, os primos, e os que, por este sacramento, se cruzam com as nossas vidas. A todos, o nosso obrigado.
Márcio, queria agradecer-te em particular: como irmão, amigo e familiar. Recebe-nos na tua casa fazendo parte da nossa casa. Estou certo que do aconchego se fará ternura e do lar se farão frutos; certo estarás que há caminhos que se cruzam eternamente.
Raquel, as coisas vulgares que há na vida não deixam saudades, só as lembranças que doem ou fazem sorrir. Dizia amiúde um poeta que a saudade é a prova de que o passado valeu a pena; sentirei sempre saudades tuas e quero continuar a senti-las. Quero vivê-las ao teu lado, continuar a contemplar a fineza do teu gesto, a delicadeza do sorriso e a candura das tuas confissões. É profundamente transformador ter uma irmã como tu. Obrigado: pela não desistência; pela consciência da diferença; pelo amor incondicional; do que dói e depois faz sorrir.
Peço palavras emprestadas: «“Olharei a tua sombra se não quiseres que te olhe a ti”, e ele respondeu: “Quero estar onde estiver a minha sombra se lá é que estiverem os teus olhos”. Amávamo-nos e dizíamos palavras como estas, não apenas por serem belas e verdadeiras, se é possível serem uma coisa e outra ao mesmo tempo, mas porque pressentíamos que o tempo das sombras estava a chegar e era preciso que começássemos a acostumar-nos, ainda juntos, à escuridão da ausência definitiva.»1
Completo dizendo que a vida é uma canção; o amor a sua pauta; a família uma nota. A saudade é nossa e de todos os dias e casou com a alegria; juntos tiveram a memória e puderam recordar momentos como este. Que continuemos a sentir a chuva a molhar-nos o rosto.
Luís Gonçalves Ferreira, 30 de abril de 2016. A propósito do casamento da minha irmã Raquel.
1. José Saramago, Um Capítulo Para o Evangelho, 2009.
<3 Só tenho a dizer, que isto foi lindo <3 Parabéns pela família fantástica que tens! E muitas felicidades :)
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