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liberdade, Gisela João e o tempo em que estamos*


Gisela João,  Labirinto ou Não Foi Nada 

Sou testemunha de um tempo - feliz, é certo - em que, no canal aberto da televisão nacional, um programa de transformismo vence audiências. Sou do tempo - feliz, é certo - que, após uma besta quadrada fascista ter vencido as eleições na América desfeita, o fado me congratula com alegria. Passado e futuro; aceitação, verticalidade, tolerância e amor. Só amor. Sou do tempo - meus netos, filhos e anciãos da memória - em que o amor vencia nas ruas e nos palácios de gelo, enquanto o ódio ganhava votos no fundo de uma urna. 
A democracia cai nas ruas da amargura; as pessoas não. Enquanto houver memória (que Deus guarde a minha), e se tudo mudar entre uma guerra ou um caos de fome, a cultura dirá aos vindouros, em jeito de recordação, que vivemos um auge bonito de aceitação; um culminar absoluto de beleza no ser quem se quer ser. 
Olhamos tantas vezes para o passado, procurando glórias e impérios, esquecendo que o maior triunfo é o nosso presente. Presente rima muito bem com felicidade e aniversário e tudo de bom que isso significa. 
Quero nunca esquecer deste tempo, mesmo que as trevas se inaugurem em diante. É uma espécie de sonho, de júbilo, como da saúde súbita de um doente terminal se tratasse. 
Espero errar-me mais à frente. Que os meus netos vejam, no seu tempo, o género contar para muito pouco. O sexo nasce-nos, mas tudo o mais não. Sonho com um tudo mais que seja muito pouco.

*O título inicial era, simplesmente, liberdade. 

Luís Gonçalves Ferreira 

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