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A Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva tem uma pequena exposição com cartazes e livros sobre o holocausto. A ideia do eugenismo, racismo, xenofobia e o binómio "nós versus eles" matou milhões de vidas ao longo da história. Não falo apenas de judeus, mas também falo deles. Judeus, ciganos, homossexuais, padres, frades, freiras, reis, republicanos, socialistas, bruxas ou mouros totalizam muitos dos nomes que compram a nossa simpatia para com quer o poder de nos governar. É por isto que falámos mal dos nossos colegas de trabalho e os tentámos tramar em muitas curvas e em algumas retas: queremos o que é deles, pois o deles parece melhor que o nosso. O compromisso com a pessoa humana tornou a Europa do pós 2.ª Guerra Mundial um sítio de liberdade e crescimento económico que proporcionou o aumento da qualidade de vida de todos e todas. Este quadro de crescimento intelectual fez de nós - Europa - um continente querido, desejado, mas também - e eternamente - colonizador, pelo que quer o que é dos outros enquanto é dos outros. Os disparates do populismo, que joga com os sentimentos mais básicos do ser humano (ódio e sobrevivência), teriam apenas e só que nos envergonhar; isto se tivéssemos memória. Mas não. O progresso e a civilidade conseguem ter retrocessos e são as situações-limite que nos fazem abdicar dos princípios morais e éticos em função do plano inalterável de resistir. Isto faz-me lembrar o Ensaio Sobre a Cegueira e o espetáculo de animalidade que a sobrevivência expunha. É a pressão dos recursos - da árvore, da terra, do posto de trabalho, do capital humano, do dinheiro no banco, da competição pelo número, do poder da liderança? Estamos a perder o respeito pelo que nos tornou o que somos enquanto civilização. Estamos a perder um sentimento chamado empatia que, nas nossas constituições, é um conceito dito "pessoa humana". Perdemos a pessoa e, na mesma medida, perdemo-nos também; somos sapos a mastigar caviar com a boca aberta em frente a um espelho.

Luís Gonçalves Ferreira
Escrito em 28 de janeiro de 2020

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